SÃO PAULO – Mais de duas décadas desde a última conquista da Copa do Mundo da FIFA e sem uma escolha consensual local, o Brasil pensa em quebrar um tabu não escrito: contratar um técnico estrangeiro. Depois de seis anos no cargo, Tite deixou o posto da Seleção Brasileira no mês passado, após a eliminação da Seleção nas quartas de final da Copa do Mundo contra a Croácia. Apesar de saber há algum tempo antes da final do Catar que Tite estava saindo, o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ednaldo Rodrigues, ainda não encontrou um substituto. Agora ele está ampliando sua busca. “Não temos preconceitos de nacionalidade”, disse ele em 17 de janeiro. “Queremos que seja um técnico respeitado que possa trazer um nível de jogo digno dos atletas. Queremos fazer o que o Brasil sempre tentou fazer: ser muito ofensivo.” Além da Inglaterra, que contratou o sueco Sven Goran Eriksen e o italiano Fabio Capello nos anos 2000, quase nenhuma outra grande nação do esporte teve um técnico estrangeiro nas últimas décadas. A seca do Brasil na Copa do Mundo – que remonta ao seu triunfo deslumbrante em 2002 com um ataque de três frentes composto por Ronaldo, Ronaldinho e Rivaldo – forçou o pentacampeão mundial recorde a lançar a rede mais longe. Existem potenciais candidatos brasileiros, mas nenhum obteve amplo apoio. “Temos boa qualidade, mas antes produzíamos mais treinadores do que agora”, disse recentemente Luiz Felipe Scolari, o técnico campeão de 2002. “A nova geração … não ganhou troféus suficientes.” Os meios de comunicação brasileiros têm proposto inúmeros possíveis candidatos, incluindo os espanhóis Pep Guardiola e Luis Enrique, o italiano Carlo Ancelotti, o francês Zinedine Zidane, o português José Mourinho e até os argentinos Marcelo Gallardo e Mauricio Pochettino. Guardiola, do Manchester City, e Ancelotti, do Real Madrid, se descartaram, embora o espanhol tenha dito há alguns anos que gostaria de liderar uma seleção nacional quando deixar os atuais campeões da Premier League. “Desde o final do ano passado acho que ouvi 26 nomes. Vamos atrás de alguns deles”, disse Rodrigues, que espera ter o novo homem no cargo até março. Mas não é fácil contratar um técnico de nível mundial quando os principais clubes europeus podem pagar salários tão inflacionados e oferecer a chance de disputar a Liga dos Campeões ou títulos nacionais. Também não é fácil convencer a torcida brasileira a aceitar um “gringo” no comando da Seleção. Uma pesquisa em dezembro descobriu que 48% eram contra a ideia, com apenas 41% a favor. A taxa de rejeição foi pelo menos menor do que em pesquisas anteriores. “No Brasil existe uma ideia: temos o melhor futebol do mundo, então não precisamos de um técnico estrangeiro nos dizendo como jogar”, disse Victor Figols, historiador e editor do site esportivo Ludopedio. “Nós, que sabemos formar grandes jogadores, que em parte criamos o drible, a forma de jogar o jogo bonito.” O Brasil já teve treinadores estrangeiros, embora seus reinados tenham sido fugazes. O uruguaio Ramon Platero ocupou o cargo em 1925, o português Jorge Gomes de Lima treinou a Seleção ao lado do brasileiro Flávio Costa em 1944 e o argentino Filpo Nunez teve uma breve passagem em 1965. Mas os estrangeiros foram descartados quando o Brasil, com treinadores nacionais, se consolidou como uma potência mundial do futebol. Ao contrário, treinadores como Scolari, Vanderlei Luxemburgo, Carlos Alberto Parreira, Ricardo Gomes e Zico assumiram o comando de outras seleções. “Foi construída uma imagem ao longo da história de que, como desenvolvemos grandes jogadores, também desenvolvemos grandes treinadores, mas não é verdade”, disse Figols. “Se olharmos para o ranking da Fifa, os técnicos brasileiros não estão nem entre os 10 primeiros.” Existem alguns candidatos locais que fazem sucesso na imprensa, como Dorival Junior, que conquistou a Copa Libertadores de 2022 com o Flamengo, ou Fernando Diniz, do Fluminense, Renato Portaluppi, do Grêmio, e Mano Menezes, do Internacional. Mas nenhum deles tem um currículo comparável ao de Tite antes de assumir a seleção brasileira. Com o Corinthians, Tite conquistou a Copa Libertadores, dois títulos brasileiros e o Mundial de Clubes em cinco anos. “Precisamos melhorar o nível de quem mora aqui, independentemente de contratarmos um estrangeiro ou um brasileiro”, escreveu Paulo Vinicius Coelho, autor do livro “Escola Brasileira de Futebol”, ao jornal Folha de São Paulo. “Guardiola não virá. Mas isso não impede que o Brasil… desenvolva nosso próprio Pep Guardiola dentro de alguns anos, como já desenvolvemos Zagallo e Tele Santana”, acrescentou.

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